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30 outubro 2012

Clube de Poesia e Cultura Omo Layo é reaberto.

Liderança do Grupo Omo Layo: Sidclei Junior, Oga Filipe Tantasile, Jean e Ebomi Alda Ominire


O Clube de Poesia e Cultura  Omo Láyò (22/06) foi reaberto pelo novo grupo de jovens filhos do Terreiro São Bento, alguns iniciados no Axé como a Ebomi Alda Ominire e o Ògá Filipe Tantasile, e os Abia Jean e Junior, numa reunião no Salão de Pedra Branca em Salvador. Orientados pela Ìyáláse e Professora Celeste que fundou o grupo em sua adolescência no Terreiro (1994),  e da Ìyàwó e estudante de Pedagogia Jandira Lokeni que atuará como Orientadora de Grupo. A reabertura do grupo traz uma proposta ampliada visando atender a jovens iniciados ou adeptos do candomblé residentes da ilha em Vera Cruz, para desenvolver um projeto  pedagógico através do Clube de Poesia, de uma roda de Samba que tem repertório próprio, com acompanhamento psicopedagógico, palestras e atividades lúdicas todas com base nos princípios religiosos  e tradicionais do Terreiro  São Bento.

A parceira com a Biblioteca Betty Coelho (Liderada pelo amigo e parceiro o poeta Douglas de Almeida) e um acervo próprio de títulos sobre Candomblé  é a estratégia para o acesso ao desenvolvimento intelectual e religioso destes jovens através da oralidade, contando ainda com as palestras da Ìyálórìsá Alda sobre religiosidade e disciplina hierárquica do Àse alem dos encontros para atividades de psicologia de grupo.  Os jovens tem se reunido nos ultimos finais de semana para leituras, orientações religiosas e construção do projeto.

Casamentos no Terreiro

Casamentos - Frutas Frescas no Terreiro São Bento
Lugana Olaia

Altar do Templo de Orisanlá - Casamento da Iyalase Celeste Osairanle e Samuel Azevedo -
Terreiro São Bento 08.01.2012
Vivemos numa sociedade que ainda casa, mas que se separa com a mesma velocidade. Poucos acreditam na necessidade do estar junto de maneira definitiva, com um documento dizendo isso para a sociedade. Criaram-se novas formas de união. Isso é bom, principalmente, porque as mulheres não estão mais obrigadas a aceitar um casamento eterno, infeliz e sem amor. Conquistaram sua independência sentimental!


O casamento ainda traz aquele ar de tradição, muitas vezes aparece para sacrificar os sonhos, os planos da vida de solteiro. Mas não é assim para todos. Há quem enxergue a possibilidade de caminhar ao lado de alguém, dividindo o peso, multiplicando as alegrias e crescendo juntos, colocando em prática novos projetos que vão unir a vontade dos dois.

 Quando um casal decide oficializar este desejo de viver em matrimônio, eis que surge a religião para abençoar este aliança. É um vínculo intenso, que envolve uma troca de energias e forças profundas. Foi o que eu vi e senti ao estar presente na cerimônia realizada por meu pai Oxaguiã, sobre as cabeças de Celeste e Samuel.

Ainda que nenhuma palavra fosse dita, era possível se arrepiar com o batuque dos atabaques, se entorpecer com o aroma das folhas sob nossos pés, e vibrar com o tilintar das moedas que foram atiradas como sinal do compromisso de todos na manutenção daquele sentimento de paz e harmonia entre os noivos.

Eles escolheram caminhar juntos daqui pra frente, e cada orixá através de seu filho, lhes abençoou. Enrolados na mesma manta eles recolhiam o dinheiro, e aquela imagem foi perfeita para representar sua decisão de cumprir mais uma nova tarefa juntos.

Os noivos se emocionaram, muitos deixaram as lágrimas caírem. Foi uma celebração de luz, de frescor e encantamento. Talvez aquele tenha sido o instante em que um inconsciente coletivo tomou conta, e foi possível pensar nos obstáculos que um casal enfrenta, no quanto foi preciso investir para chegar até ali e como eles precisam contar com o apoio dos familiares, amigos e anjos da guarda para alcançarem o futuro que os espera.

No casamento você conquista outro ser que passa a existir de uma maneira diferente na sua vida, ocupa a posição de companheiro, parceiro, cúmplice, sócio. Ele vai comprar sua briga, se comprometer com seus problemas e de certo trará  toda a bagagem dele no pacote. Coragem também é a palavra de ordem!

Na água que fazia brilhar os olhos de uma noiva tensa com a organização da cerimônia e um noivo totalmente entregue a um ritual que não lhe era familiar, era clara a entrega de ambos. A confiança que se torna costumeira entre os casais é a celebração de uma amizade muito forte e verdadeira.

Naquele dia até água do céu caiu, trazendo a mensagem de que a chuva é renovação, é alma limpa. Importante respeitar as diferenças, a forma de amar, de cuidar, ser, viver e compartilhar. Que bons ventos conduzam este amor pelo maior tempo permitido por nossos guias ancestrais.


Casamento no Terreiro São Bento

A Ebomi Emanuela Iyesire e o Ogan Tiago Jilemin
recebem a benção de Osaguiã em 29/01/2012


Na Irmandade Terreiro São Bento o casamento é a benção do Orixá para a formação da família material, a união de um homem e uma mulher, comprometidos com a continuidade da religião através da família. Pelo menos um deles deve ter alguma relação direta com o Terreiro. O casamento acontece durante três dias; em um deles são feitos grandes preceitos, no outro uma festa para a Iyabá, e em outro determinado pelo Orísá, os noivos recebem a benção em público com rituais simbólicos trazidos de uma das tribos de África por um grande Sacerdote do Culto de Ifá. Ao final da cerimônia religiosa o casal é conduzido ao salão de festas para a troca das alianças em respeito aos costumes sociais brasileiro e dividem o bolo com os irmãos e convidados.  Como nossa comunidade é registrada legalmente, os noivos também assinam o livro próprio de registro de casamento. No Terreiro São Bento já realizamos quatro casamentos, o primeiro foi no ano de 1992, outro em 2002 e este ano, em janeiro, casaram-se a Ìyálásé Celeste (TSB) com Samuel Azevedo dia 8, e a Ebomi Emanuela Iyesire (TSB) com o Ògá Tiago Jilemin no dia 29.

Texto de Alafiona nº12 - Coluna Ara ni Asé, pag 8/9


Refletindo sobre desperdício.



Refletindo sobre desperdício.
Celeste Osairanle


Na sociedade consumista em que vivemos, o desperdício é um hábito. Um mau hábito. Nosso lixo vem se tornando cada vez mais rico, encontramos desde a raspa do resto da comidinha até equipamentos eletrônicos em condições de uso. É um absurdo o que acontece com os equipamentos de informática, aparelhos que poderiam durar anos se bem conservados, mas que parecem ser fabricados  com o propósito de serem descartados de acordo com o tempo de garantia proposto pela fábrica. São tantas pecinhas miúdas que custam uma fortuna, e na hora de concertar e reaproveitar fica tão caro que o jeito é comprar outro. E o quebrado? Vai para o lixo!

E as embalagens caríssimas de perfume?  Desde o plástico do lacre até a ultima gota do perfume, e aqueles frascos maravilhosos que são atração fatal para o bolso? E as lâminas de barbear com aquele cabinho lindo! Escovas de dente que parecem objetos de outro mundo, embalagens de maquilagens, e tantos outros utensílios que são descartados todos os dias mundo afora? Não se trata de desperdício? Sim. E uma passiva e cotidiana destruição do planeta.   Alguns produtos têm a possibilidade de serem reciclados e outros que de forma alguma poderão ser reutilizados, superlotam os lixões das grandes cidades. A maioria das empresas que geram os produtos não recicláveis, pouco investem na solução para seus descartes. Tem uma marca de creme dental, que além de utilizar uma embalagem metálica para acondicionar o creme, ainda tem sua caixa toda de plástico, que não serve para nada em nossa casa.

Quando se trata de alimentos a coisa fica pior, de um lado toneladas são jogadas ao lixo das residências, dos restaurantes e das fábricas, do outro, milhares de pessoas morrendo de fome. E nem pense em fazer uma quentinha pra dar na porta. Se o morador de rua passar mal com a comida, você poderá ter sérios transtornos. Soluções? Estamos em busca delas, mais seria bastante evitarmos o consumo desmedido de produtos desnecessários, com embalagens que brilham aos olhos, custam no orçamento e na natureza. Se não houver consumidor, não haverá produto. E assim as empresas terão que repensar sua produção.

Oferenda não é desperdício!

É na alimentação que se concentra o ponto crítico de nossa reflexão, a situação do Candomblé, religião que historicamente alimenta pessoas com o propósito apenas espirito energético e que, contraditoriamente, “joga” comida fora!

Ouvi há algum tempo uma atriz na televisão dizer-se indignada com “esse pessoal que joga galinha e comida nas encruzilhadas. Deviam ter vergonha na cara e alimentar quem tem fome!”.  E então, o que dizer disso?

Oferenda a Sàngó na pedra dentro da mata - TSB 2012
São muitas as indagações e questionamentos às práticas religiosas do Candomblé, sobretudo hoje, numa sociedade “culta” onde tudo deve ser justificado com argumentos científicos, fundamentados no bom senso e no politicamente correto. Já não se pode mais esperar que um filho de santo apenas repita aquilo que já é tradição do seu mais velho, é preciso saber o porquê e pra que se faz isso ou aquilo no Àse.  Se causa desconforto, vergonha ou escárnio, não seria melhor extinguir esse costume?

O jovem Omonisa aos seis meses também come o alimento sagrado.
 Aceitar a suposta evolução proposta por alguns sacerdotes e sacerdotisas, aqueles que classificam como primitivo no Candomblé tudo que é usado para nos discriminar e nos inferiorizar, seria a melhor solução?  Não estaríamos nós, ao ceder, dissimulando a extinção de nossa religião?  Na rejeição e críticas tão severas que temos aceitado, estamos sim extinguindo nossos rituais.  Rituais estes, que na fé dos antigos, foram fundamentais condutores das energias cultuadas para nosso fortalecimento espiritual.  Estamos perdendo o direito de colocar uma oferenda na rua, ou no mar, sacramentar nosso alimento e oferece-lo nas várias formas de doação à natureza que conhecemos.  Se não foi assegurada a prática pelo folclore, ou não recebeu a “patente” de festa popular, o que observamos é que não tem constituição que faça valer nosso direito de crença.

Apesar dos conceitos cruéis de alguns seguimentos da sociedade Brasileira, da internet, televisão e rádio que falam qualquer coisa baseados em equívocos, e que não sabemos quais os critérios usados para as informações,o Candomblé se mantém resistente buscando apoio nas leis que quase nunca nos contemplam. Tem sido cada dia mais difícil para as Ìyálórísá  manter  suas casas de acordo com os ensinamentos  recebidos de seus ancestrais.

Oferenda Feijoada de Ògún - Alimento para todos que chegarem no Ile Ase
e o excedente e distribuído na comunidade vizinha em quentinhas.
Não há desperdício no Candomblé. Temos vários rituais que designam a energia dos alimentos para quem é de direito, da forma que foi determinado pela divindade. Não cobramos nada pelo prato de comida que damos nas festas públicas. Não fazemos jejum, nem cultuamos a fome. Todos os rituais no Candomblé tem comida, fonte de energia vital para qualquer ser, tão sublime e necessária que seu perfume alimenta os espíritos. Nem todos os famintos podem entrar no Terreiro pra comer, material ou espiritualmente. Essa é uma linguagem só entendida por quem tem a sensibilidade para tal.

Então, será que você nunca viu gente comendo nas encruzilhadas ou pessoas catando comida no lixo? Você não joga comida fora? Qual a sua responsabilidade na fome mundial?  O povo de Àse não entende oferenda como desperdício, nós alimentamos quem tem fome de toda forma que nos é possível. Para nós, espírito também come.

Texto de Informativo Alafiona nº 12 - coluna Bawijo pag 7/8